sexta-feira, 18 de abril de 2008

Emissão #63 - 19 Abril 2008

A 63ª emissão do MULTIPISTAS - MÚSICAS DO MUNDO, difundida no sábado, 19 de Abril, entre as 17 e as 18 horas, na Rádio Urbana (Castelo Branco - 97.5 FM; Fundão, Covilhã e Guarda - 100.8 FM), vai de novo para o ar na quarta-feira, 23 de Abril, entre as 21 e as 22 horas, sendo reposta três semanas depois (10 e 14 de Maio) nos horários atrás indicados.

"Indá Pastores", Fadomorse (Portugal) - folk, world fusion
Os Fadomorse inauguram o programa
com “Indá Pastores”, tema que faz parte do seu terceiro álbum de originais “Folklore Hardcore”, editado este ano. A banda transmontana, criada em 2000 na cidade de Mirandela, explora os timbres dos instrumentos tradicionais (acordeão, flauta transversal, gaita de foles, cavaquinho, viola braguesa ou guitarra portuguesa) e a riqueza harmónica e melódica do cancioneiro nacional, acrescentando-lhes no entanto novas tendências e sonoridades. Sons que o grupo de sete elementos descreve como sendo uma fusão da raiz popular portuguesa com a melhor música do mundo, mas que não estão necessariamente associados a estilos ou géneros específicos. Influenciados por nomes como Zeca Afonso, Sérgio Godinho, Gentle Giant, Frank Zappa ou Mr Bungle, os Fadomorse apresentam um conjunto ritmado de inéditos e arranjos, cantados nos vários sotaques do país, da Madeira aos Açores, sem esquecer o Alentejo. Aventuras sonoras onde eles têm contado com as colaborações de Adolfo Luxúria Canibal (Mão Morta), Abel Beja (Primitive Reason) ou Peixe (Pluto). A 24 Abril, os Fadomorse vão estar em Santa Iria da Azóia. Já em Maio, eles tocam no D’Orpheu, em Águeda (dia 2), rumando depois até ao Festival Ollin Kan, na Cidade do México (dias 5, 9 e 11).

"Lagos Sisi", Bola Johnson (Nigéria) - highlife, afrofunk, pajoka
As músicas do mundo prosseguem com Bola Johnson e "Lagos Sisi", história de uma rapariga do campo (sisi é uma expressão atribuída a uma jovem atraente) que vai para a cidade e se comporta de uma forma que certamente não agradaria aos pais. Uma provocação sonora onde a pop ocidental se funde com comentários sociais e amostras do highlife. O tema pertence ao álbum “Lagos Sisi/Jeka Dubu”, lançado em vinil em 1973, fazendo hoje parte da compilação editada trinta e um anos depois “Afro Baby: The Evolution of The Afro-Sound in Nigéria 1970-79”. Convém recordar que afro-man e afro-baby eram os títulos atribuídos àqueles cuja rebelião melhor personalizava uma geração optimista, inspirada pelo movimento dos direitos civis e pelo psicadelismo americano, e comprometida com a procura das suas raízes culturais, depois de uma era colonial em que muitas das suas tradições haviam sido suprimidas. Referência do highlife, tal como a sua banda Easy Life Top Beats, Bola Johnson focou-se na soul de James Brown e numa mistura de highlife, jazz e funk a que chamou pajoka. A fusão criativa e enérgica dos ritmos africanos com estes e outros sons ocidentais como o rock foi aliás um fenómeno em todo o continente, em especial nas cidades e pistas de dança nigerianas. Uma herança legada nos anos 60 por Fela Kuti e Orlando Julius, que então descobriram a pólvora musical africana ao combinarem o highlife com elementos do jazz e do rhythm & blues.

"Leroy", Tweak (Suiça) & Tony Allen (Nigéria) - afrobeat, afrofunk, electronica
Tweak e Tony Allen apresentam-nos “Leroy”, trabalho onde o produtor suiço adapta as percussões jazzísticas africanas às pistas de dança, acrescentando-lhes as melodias das guitarras, pianos e sintetizadores. Tema retirado do álbum “The Allenko Brotherhood Ensemble”, colectânea de remisturas editada em 2001. Um projecto onde os Troublemakers, Cinematic Orchestra, Boozoo Bajou, Jeff Sharel, entre outros, criam uma electrónica minimalista, servindo-se para isso do estilo polirítmico de Tony Allen. Tweak, cujo verdadeiro nome é Cyril Boehler, trabalhou noutras produções do género com Seelenluft ou os Freeform Arkestra, tendo vindo a fazer ainda música para filmes ou anúncios de televisão. Tony Allen foi percusionista e director musical durante uma década dos Africa 70, banda do lendário Fela Anikulapo Kuti. Os dois criaram a afrobeat, resultado do cruzamento do highlife que então efervescia na Nigéria e no Gana com o jazz das big bands, o funk e a soul de James Brown. Já fora da banda, e com o seu próprio grupo, os Egypt 80, Tony Allen desenvolveu então o afrofunk, um novo estilo que combinava a afrobeat com a electrónica, a dub, o rhythm & blues e o rap. De passagem por Londres e Paris, o percussionista nigeriano gravaria com outros artistas africanos como King Sunny Ade, Ray Lema e Manu Dibango, colaborando também com músicos caribenhos ou americanos. Já em 2006, a lenda viva da afrobeat juntou-se aos The Good, the Bad and the Queen. Batidas que Tony Allen irá trazer a Portugal a 1 de Agosto, num espectáculo a realizar no Centro Cultural de Belém, em Lisboa.

"Assouf", Tinariwen (Mali) - touareg music, rock, blues
A jornada continua com uma viagem até ao deserto pela mão dos Tinariwen, que nos trazem “Assouf”, tema extraído do álbum “Aman Iman” (Água é Vida), gravado em Bamako e lançado em 2007. Este clã apareceu em 1982 na Líbia num campo de acolhimento de rebeldes tuaregues (povo nómada descendente dos berberes do norte de África e que vagueia entre a Argélia, o Mali, o Níger e a Líbia), tocando para a comunidade de exilados naquele país e na Argélia. Três jovens encarnam a Ishumaren, a música dos ishumar desempregados, uma geração que sonha com a liberdade e a auto-determinação. São sobretudo melodias tradicionais, inspiradas nas guitarras do norte do Mali ou nos alaúdes (ngoni para os songhai, teherdent para os tuaregues) dos griots, e canções nostálgicas que apelam ao despertar político das consciências e à rebelião da alma. Em 1990, dois elementos dos Taghreft Tinariwen (literalmente, os "reconstrutores dos desertos") integraram o grupo de guerrilheiros separatistas que atacou um posto militar em Menaka, na fronteira com o Níger, inaugurando um novo conflito com o governo do Mali. Seis anos depois, quando a paz chegou finalmente ao sul do Sáara, voltaram-se apenas para a música do seu povo, em geral acompanhada pelo tindé (instrumento de percussão tocado por mulheres) ou pela flauta t’zamârt. Na sonoridade rítmica e harmónica dos Tinariwen, percussores dos blues do deserto, estão presentes também a guitarra eléctrica e a asoüf, solidão característica da poesia tuaregue que, tal como os blues, incorpora um sentimento de desamparo universal.

"Ganyo Maada", Etran Finatawa (Níger) - wodaabe and touareg music
Os Etran Finatawa regressam ao programa com "Ganyo Maada" (Inveja), parte integrante do seu segundo trabalho “Desert Crossroads”, editado este ano. Em 2004, seis músicos wodaabes e quatro tuaregues, unidos pelo gosto pela música e pelo desejo de paz entre todas as etnias que vivem ou viajam pelo Níger, na fronteira com o Mali, juntaram-se e formaram este grupo. Eles são dois dos lendários grupos étnicos nómadas que vivem na savana do Sahel, no sul do Sáara. Durante milhares de anos, a região foi um ponto de passagem entre os árabes do norte de África e as culturas subsarianas. Enquanto que os wodaabe, de etnia fulani, são conhecidos pelos seus rebanhos e gado, os tuaregues, berberes que falam tamashek, são famosos criadores de camelos. Mesmo tendo culturas e línguas muito distintas, os elementos dos Etran Finatawa (As Estrelas da Tradição) ultrapassaram as fronteiras étnicas e o racismo, trabalhando juntos para construírem um futuro melhor para os seus povos. Eles combinam instrumentos tradicionais e canções polifónicas com arranjos modernos e guitarras eléctricas. O resultado é um cruzamento entre o blues, o rock e o funk, mistura melódica onde se destacam as vozes nostálgicas que descrevem as suas raízes culturais e uma forma de vida cada vez mais relegada para o passado.

"Kamloreja", Esma Redzepova (Macedónia) - gypsy music
Segue-se Esma Redzepova com “Kamloreja”, tema extraído do álbum “Čhaje Šhukarije”, editado em 2001. Trabalho produzido pelo trompetista klezmer Frank London, e que juntou músicos de todo o mundo. Esma nasceu em 1943 numa pequena povoação perto de Skopje, a capital da Macedónia, precisamente a cidade onde Emir Kusturica rodou “O Tempo dos Ciganos”. Na escola, aos 14 anos, a cantautora foi convidada a cantar num concurso da Radio Skopje. Concerto onde conquistou o primeiro lugar e a atenção do músico e futuro marido Stevo Teodosievski. Esma começa então uma tournée com o seu ensemble musical. Num festival no norte da Índia é baptizada como “Rainha dos Ciganos”, alcançando a partir daí grande popularidade. As suas canções, semelhantes às melodias típicas dos Balcãs, são a expressão musical do seu amor pela Macedónia. Uma voz vibrante a que se juntam o violino, o clarinete e o acordeão, sem esquecer as influências da Índia, Pérsia e Espanha, num ambiente alegre e sensual. A diva dos Balcãs tem actuado nos palcos mais importantes do mundo, sendo hoje a grande embaixadora da cultura cigana da Macedónia. Até agora já foram mais de oito mil concertos e 500 canções, o que inclui 108 singles, 20 álbuns e 6 filmes. Nomeada por duas vezes para o prémio Nobel da Paz pelo seu trabalho humanitário, ela e o seu falecido marido adoptaram 47 dos rapazes órfãos que encontraram nas suas viagens, treinando-os para serem músicos.

"Alili", Fanfare Ciocărlia (Roménia) – gypsy brass band, balkan music
A Fanfare Ciocărlia (“laverca”, em romeno) traz-nos “Alili”, tema retirado do álbum “Gili Garabdi – Ancient Secrets of Gypsy Brass”, lançado em 2005. Esta orquestra de metais, fundada pelo clarinetista Ioan Ivancea (já falecido), é célebre pelo improviso e pela interpretação acelerada de solos de clarinete, saxofone e trompete, por vezes com mais de 200 batidas por minuto. Eles começaram por tocar em cerimónias populares, até que o produtor discográfico e engenheiro de som alemão Henry Ernst (seu actual manager) os descobriu em 1996. Oriundos da aldeia de Zece Prăjini (“Dez Campos”), no nordeste da Roménia, junto à fronteira com a Moldávia, os demónios acelerados do gypsy brass cruzam a tradição balcânica com influências globais, adaptadas ao seu estilo enérgico e festivo. Danças tradicionais romenas e moldavas como a sîrba (“dança” em romeno), a hora (dança de círculo) ou a geamparale (popular dança da região de Dobrogea, caracterizada por ritmos balcânicos e turcos), bem como os ritmos turcos, húngaros, búlgaros, sérvios e macedónios são apresentados ao som de instrumentos de sopro (trompa, tuba, trompete, clarinete, requinta, saxofone e corneta) e percussão (tímpano e bombo, tarola e bongo). Juntam-se-lhes histórias sobre a vida, cantadas em romeno ou em romani (dialecto cigano). O grupo tem colaborado com expoentes máximos da música cigana como a macedónia Esma Redzepova, o sérvio Šaban Bajramović, estrelas da pop romena e búlgara como Dan Armeanca e Jony Iliev, bem como Florentina Sandu (Roménia), Mitsou (Hungria), Ljiljana Butler (Bósnia), Kal (Sérvia) ou os Kaloome (França).

"Viatjar Per La Ment", Nour (Espanha) - raï, rock, funk, reggae
Despedimo-nos com os Nour (“luz”, em árabe), que desta feita nos trazem o tema “Viatjar Per La Ment” (Viajar Pela Mente), retirado do seu primeiro disco “Papier Mullat” (Papel Molhado), lançado em 2007. Um papel que se converte numa enorme bola de fogo, alimentada por uma fusão de estilos de que resulta uma música para todos os sentidos. A electrónica combina-se então com sonoridades como o reggae, o rock, o funk, o hip-hop, o ska ou o raï, revestidos com letras em catalão, castelhano, francês e árabe. Os Nour foram criados pelo berbere catalão Yacine Belahcene Benet, vocalista dos Cheb Balowski, fazendo parte do grupo Marc Llobera (samplers e teclados), Pablo Potenzoni (bateria), Francisco Guisado “El Rubio” (guitarra), Olalla Castro (voz) e Manolo López (baixo). Produzido por Yacine e Rubio com Pau Guillamet (Guillamino), o primeiro trabalho da banda reflecte sobre a necessidade de ir mais além das palavras, denunciando assim as hipocrisias da sociedade moderna. Uma crítica sonora à intolerância e à desigualdade em que colaboram, entre outros, Joan Garriga (dos La Troba Kung-Fú), Lautaro Rosas (Machalah), Massa Kobayashi (Kultur Shock), Mohamed Souleimane (Orquestra Árabe de Barcelona) ou Pau Llong y Rodrigo (At Versaris).

Jorge Costa

segunda-feira, 14 de abril de 2008

Iberfolk regressa a Sortelha em Setembro


Durante três dias, a música tradicional invade a aldeia histórica
(foto: Rodobalho/Transcudância)

Entre 5 e 7 de Setembro, o Iberfolk – Festival de Cultura Tradicional está de regresso a Sortelha (Guarda). Promovido pela associação cultural Transcudânia, pelos colectivos Rodobalho e Tradballs e pela junta de freguesia daquela aldeia histórica, o certame pretende ser um ponto de encontro “em redor da música, da dança e da cultura tradicional, nas suas diversas formas de reconstrução e reinterpretação”.
Em 2008, o publico, maioritariamente jovem, é de novo o elemento central da terceira edição do Iberfolk, aberto às propostas de todos aqueles que se queiram juntar “seja na logística, seja no palco”, conforme refere a organização. O mote é a música tradicional, interpretada de forma inovadora, temática a que se juntam, à semelhança dos anos anteriores, a dança, o teatro, a exibição de documentários, a realização de caminhadas e escalada, as observações astronómicas ou os ateliês. “O programa será um misto de aprendizagem e descoberta – das danças, dos instrumentos, das artes, da paisagem – durante o dia, e de partilha e alegria em sons diversos à noite”, acrescentam os responsáveis pelo evento.

sexta-feira, 4 de abril de 2008

A festa ambulante dos Kumpania Algazarra

A sonora algazarra de Sintra vagueia pelas músicas dos cinco continentes, transformando os sons em que toca numa festa ambulante, ao estilo das fanfarras europeias. O seu primeiro álbum, agora lançado, sintetiza as andanças pelo país e pela Europa, viagens em que a banda contaminou e se deixou contaminar por outros garimpeiros.


Fundir géneros e animação é a fórmula seguida pelo grupo
(foto: Kumpania Algazarra)


Eles surgiram em Sintra em 2004, e desde então que os Kumpania Algazarra apostam numa música enérgica, feita para ser interpretada e dançada na rua. Servindo-se da habitual linha de instrumentos de sopro (clarinete, saxofone, trompete e trombone), a que se juntam o acordeão, a guitarra, o contrabaixo ou as ribombantes percussões, os oito jovens elementos do grupo (acresce outro, convidado no álbum de estreia da banda) tocam e cantam em várias línguas, entre elas o português. Uma sonora algazarra que deambula pelas músicas do mundo, transformando os sons em que toca numa festa ambulante, bem ao estilo das fanfarras europeias.

“O primeiro propósito foi sem dúvida a música. Depois, quase ao mesmo tempo, pensámos: já que tocamos instrumentos portáteis que não necessitam de electricidade, porque não irmos para a rua e tentarmos fazer disto uma festa, numa partilha com as pessoas que sempre acorrem às ruas de Sintra?”, conta ao MULTIPISTAS - MÚSICAS DO MUNDO Luís Bastos, clarinetista e saxofonista dos Kumpania Algazarra. “Poderiam haver muitos adjectivos a usar quando nos referimos a esta banda. Muita da imagem que passa para fora é uma imagem real. Poucas coisas ali são fictícias ou arranjadas para dar um certo ar. A banda é muito assim, é genuína”.


Uma genuína mistura de sentidos e sonoridades, que é também uma provocação à música cada vez mais homogénea. Referências que os Kumpania Algazarra foram buscar aos cinco continentes e a nomes como Emir Kusturica, Fanfare Ciocărlia, Gogol Bordello, Rachid Taha, Fela Kuti, Buena Vista Social Club, Manu Chao ou Bob Marley. Os ritmos ciganos balcânicos, árabes e latinos aliam-se então a estilos como a afrobeat, a folk, o reggae, o funk, o ska, o son, o swing, o klezmer, o gnawa ou o rock. Um ambiente multicultural onde a banda abre espaço a temas caros a toda a sociedade como a guerra, a pobreza ou a imigração.

“As causas sociais e a festa podem não andar de mãos afastadas, podem coexistir. Para nós, faz todo o sentido de aproveitarmos da melhor maneira tudo aquilo que sabemos fazer, e tentarmos com isso pôr alguma igualdade neste mundo em que vivemos”
, justifica o músico. “As diferentes proveniências de estilos musicais advêm também do grande número de elementos que compõem a banda. Cada um tem as suas influências e cada um as traz depois para a sala de ensaio. Aí, muitas dessas ideias são escutadas e discutidas, e depois nós chegamos a um resultado. E esse resultado reflecte paisagens sonoras às quais nós não estamos habituados em Portugal”.

Paisagens coloridas, cada vez mais habituais no universo da música do mundo. Com o nomadismo nos genes, a caravana começou a cruzar a Europa. Depois de uma passagem pelo Festival Andanças e de terem realizado vários espectáculos na Galiza e no País Basco, eles partiram numa digressão à descoberta da Eslovénia. Segue-se a Itália, onde os Kumpania Algazarra irão estar entre 29 de Maio e 1 de Junho. Percursos onde contaminam e se deixam contaminar por outros garimpeiros de sons, entre eles os Blasted Mechanism, os Terrakota e as Tucanas.

“O contágio faz-se para além da música porque existem relações humanas muito fortes com cada uma dessas bandas. Ainda antes de tocar nos Algazarra, nos primeiros álbuns de Blasted Mechanism era eu que tocava os sopros. Os Terrakota fazem também parte da grande família da Algazarra, tal como as Tucanas, que nos convidaram para participar no álbum delas. Claro que nós dissemos que sim, porque gostamos destas contaminações musicais que existem de banda para banda”, refere Luís Bastos. “Neste mundo globalizado, cada vez é mais fácil o acesso a diferentes fontes musicais. Temos sempre a tendência de olhar para elas com algum espanto, daí que é grande a tentação de mexer com elas. Há uma variedade quase interminável de possibilidades, o que sem dúvida atrai muito os músicos e compositores”.

Em Fevereiro, os Kumpania Algazarra lançaram o seu primeiro disco, baptizado com o nome do grupo. Uma edição própria que inclui doze temas originais, inspirados em diversas latitudes sonoras. Parte do caminho trilhado até agora, sem pressas, pela banda, que em mãos tem já material para um segundo trabalho.


“Quatro anos volvidos, e depois de muita estrada e rua, apareceu o primeiro álbum que é o reunir dos temas que até então temos vindo a tocar. Como é o primeiro, nós pensámos que tinha de ser bem feito, com o nosso tempo e à nossa maneira, sem a pressão de uma editora”, acrescenta o clarinetista e saxofonista. “Poderemos esperar o reforço de características da banda, mas as influências são tantas que é provável que também nos deixemos contaminar por novidades musicais”.

A algazarra de experimentações prossegue, tendo como pano de fundo uma panóplia global de influências. Mundo sonoro em permanente ebulição, todo ele entregue à imaginação fértil desta fanfarra portuguesa.

Jorge Costa

Emissão #62 - 5 Abril 2008

A 62ª emissão do MULTIPISTAS - MÚSICAS DO MUNDO, difundida no sábado, 5 de Abril, entre as 17 e as 18 horas, na Rádio Urbana (Castelo Branco - 97.5 FM; Fundão, Covilhã e Guarda - 100.8 FM), vai de novo para o ar na quarta-feira, 9 de Abril, entre as 21 e as 22 horas, sendo reposta três semanas depois (26 e 30 de Abril) nos horários atrás indicados.

Um programa especial, onde se destaca a entrevista exclusiva aos Kumpania Algazarra, a propósito do lançamento do primeiro álbum da fanfarra portuguesa.

"Mescufurus", Red Cardell (França) - folk-rock
Os Red Cardell a abrirem mais uma emissão com “Mescufurus”, tema retirado do álbum “Sans Fard”, sétimo trabalho da banda, editado em 2003. Originários da cidade francesa de Quimper, eles são uma das mais conhecidas bandas tradicionais da Bretanha. O grupo, formado em 1992 e de que hoje fazem parte Jean-Pierre Riou, Jean-Michel Moal e Manu Masko, começou por tocar em bares. Surgidos no movimento do rock bretão, e à margem da nova vaga celta, os Red Cardell decidiram então fundir as danças e os cantos tradicionais da Bretanha com ritmos da Europa de Leste, da América do Sul ou do norte de África. Uma viagem em que géneros como a folk berbere e ucraniana, o tango, o reggae, a dub, o funk ou o java se juntam com influências diversas que vão do punk rock anglo-saxónico ao rap e ao techno. Geografias sonoras à mistura com textos poéticos em inglês e francês, os quais abordam temas recorrentes no blues, na chanson française ou no gwerz (canto bretão a capella onde se aborda o quotidiano). Um ambiente festivo multi-étnico que tem por base instrumental o acordeão, a bombarda bretã, a flauta, as guitarras acústica e eléctrica, a bateria ou os sintetizadores.

"Te Kambian Los Tiempos", Biella Nuei (Espanha) - spanish folk
As músicas do mundo prosseguem com os Biella Nuei e o tema "Te Kambian Los Tiempos", uma polca apresentada ao ritmo do rockabilly e extraída do disco “Sol D’Iberno”, lançado em 2006. Trabalho produzido por Juan Alberto Arteche, e que encerra a triologia iniciada com “Las Aves Y Las Flores” (1994) e “Solombra” (1998), abrindo portas a uma fase mais criativa no percurso deste grupo fundado por Luís Miguel Bajén na década de 1980. Álbum optimista e alegre, onde os Biella Nuei se abrem às percussões das culturas andaluza ou latina, e que conta com a participação de músicos como Eliseo Parra ou La Ronda de Boltaña. Nos primeiros anos, o septeto centrou-se no estudo e divulgação da tradição oral aragonesa, no desenvolvimento de repertório próprio e no fabrico de instrumentos como a gaita de boto, o saltério, o pífaro ou a dulzaina. Hoje permanece a variedade de instrumentos, melodias e ritmos tradicionais populares daquela região (jota, pasacalle ou tarantaina), mas a free folk da banda, mestiçagem étnica sempre ligada aos movimentos sociais, cruza-se com outras culturas, deixando-se influenciar, entre outros géneros, pelos blues, pela rumba, pela choutiça ou pela soul cubana. Nas suas peregrinações sonoras, os Biella Nuei, que em palco se apresentam ainda com uma formação mais pequena - os Bufacalibos -, têm vindo a tocar com Carlos Núñez, Cristina Pato, Chico Sánchez Ferlosio, Kepa Junkera, Mauricio Martinotti, The Oysterband ou os Gwendal.

"Charrada del Tío Frejón", La Musgaña (Espanha) - spanish folk
Os La Musgaña de regresso ao programa, desta feita com “Charrada del Tio Frejón”, tema retirado do álbum "Temas Profanos”, editado em 2003. O sexto disco do grupo conta com as colaborações de Carmen Paris, Joaquín Díaz, David Mayoral e Pablo Martín. Em 1986, Enrique Almendros, até então intérprete de música celta, José María Climent e Rafael Martín decidiram formar um grupo centrado na tradição musical da meseta castelhana. Ainda nesse ano, juntaram-se-lhes o flautista Jaime Muñoz e o baixista Carlos Beceiro, únicos elementos que hoje permanecem no quinteto composto ainda por Diego Galaz, Jorge Arribas e Sebastián Rubio. Das melodias de dança às canções de amor, passando pela música para casamentos, os La Musgaña apresentam-nos uma ampla visão musical de uma zona marcada pela herança europeia, africana e mediterrânica. Por entre os temas evocativos destacam-se os ofertórios religiosos, as charradas, ajechaos e charros de Salamanca e Zamora, os bailes corridos de Ávila, os pindongos de Cáceres e as danças, aires e canções de León ou Burgos, ou as jotas, rogativas, dianas e villancicos de Madrid, Segovia e Valladolid. Uma celebração da música tradicional espanhola, à mistura com influências ciganas, mouriscas e celtas, em que os ritmos hipnóticos se constroem com toda uma gama de instrumentos tradicionais (gaita charra, gaita sanabresa, flauta, tamboril, cistro ou sanfona), étnicos (cajón, tar, krakeb, pandeiro iraniano, derbouka, bouzouki, req, sabar, tinajas, bendir ou marímbula) e modernos (clarinete, acordeão diatónico, saxofone soprano, baixo ou violino).

"Sangaré (Nikodemus Remix)", Vieux Farka Touré (Mali) - afropop, blues
A jornada continua com Vieux Farka Touré e “Songaré”, versão remisturada pelo DJ Nikodemus, e que ao ritmo da house se apresenta com um sabor a merengue e a soukous. Parte integrante do álbum “Vieux Farka Touré Remixed: Ufos Over Bamako”, produzido por Derek Beres e lançado em 2007. Neste trabalho, DJ’s como Cheb I Sabbah, Karsh Kale ou Yossi Fine levam para as pistas de dança a afropop – desde sempre misturada com outras sonoridades – e as melodias acústicas africanas do músico do Mali, talentoso vocalista, guitarrista, percussionista e tocador de cabaça. Nickodemus estreou-se no início da década de 1990, combinando reggae, hip-hop e breakbeat numa antiga pista de gelo junto ao rio Hudson, em Manhattan. Mais tarde, mudava-se para o Lower East Side, bairro nova-iorquino onde as influências latinas têm maior protagonismo. Inspirado pela música de Ali Farka Touré, o lendário bluesman falecido em 2006, Vieux (“velho”, em francês, em alusão ao avô) Farka (“burro”, metáfora adequada à sua teimosia) Touré acabaria por contrariar o pai, inicialmente avesso à carreira musical do filho. Depois da passagem pelo Instituto Nacional de Artes, em Bamako, o mestre da kora Toumani Diabaté convida o jovem a integrar o seu ensemble e a viajar pelo mundo. Em 2005, o baixista norte-americano Eric Herman produz o seu álbum de estreia, onde contaria com as participações de Ali e de Diabaté. Hoje, Vieux Farka Touré segue o caminho trilhado na guitarra pelo progenitor, acrescentando à tradição musical do Mali elementos ocidentais e referências do reggae, rock e blues.

"Bali Maou", Amadou & Mariam (Mali) - bambara blues, afro pop
A dupla Amadou & Mariam apresenta-nos “Bali Maou”, tema extraído do seu terceiro álbum “Tje Ni Mousso” (Homem e Mulher), editado em 1999. Um blues eléctrico, recheado de ritmos africanos, batidas funky e riffs de guitarras, onde se podem encontrar influências inesperadas como o cavaquinho de Pedro Soares. Naquela que é a mais roqueira pop africana, não faltam as habituais alusões ao quotidiano do seu país e as letras que apelam à paz, ao amor e à justiça. Mariam Doumbia começou por cantar em casamentos e festivais tradicionais, enquanto que Amadou Bagayoko era guitarrista nos Les Ambassadeurs, banda lendária a que mais tarde se juntou Salif Keita. Os dois são invisuais e conheceram-se em 1977 no instituto de cegos de Bamako, a capital do Mali. A partir de então tornaram-se inseparáveis na música e na vida. Amadou & Mariam prestam então homenagem à música tradicional maliana, revestindo-a de sons ocidentais. Cantando em francês, castelhano e no seu dialecto original, estes bambara (etnia maioritária no Mali) vão buscar referências musicais à sua adolescência: a pop, o rock psicadélico e a salsa dos anos 60, e o funk e a soul da década seguinte. Uma forma de recordarem não só as suas raízes mandingo, mas também as ligações do Mali ao gnawa, à música cubana e ao jazz, tornando universal a música daquele país.

"Skabicine", Kumpania Algazarra (Portugal) - brass band, ska, world fusion
Os Kumpania Algazarra trazem-nos “Skabicine”, tema retirado do seu primeiro álbum de originais, resultado das andanças pelo país e pela Europa onde a caravana contaminou e se deixou contaminar por outros garimpeiros como os Blasted Mechanism, os Terrakota ou as Tucanas. Produção própria baptizada com o nome do grupo, lançada em Fevereiro e cuja festa de apresentação está agendada para o dia 11 de Abril, em Lisboa. Surgidos em Sintra em 2004, os Kumpania Algazarra tocam e cantam em várias línguas (entre elas o português), fazendo-se acompanhar pelos ritmos ciganos balcânicos, árabes, latinos ou africanos, aliados à afrobeat, folk, reggae, funk, ska, son, swing, klezmer, gnawa ou rock. Um ambiente festivo onde a banda abre espaço para temas caros à sociedade como a guerra, a pobreza ou a imigração. Os nove jovens músicos (Francisco Amorim, Helder Silva, Hugo Fontainhas, Luís Barrocas, Luís Bastos, Pedro Pereira, Ricardo Pinto, Rini Luyks e o convidado Willi Kirsch), vagueiam em sonora algazarra pelas músicas dos cinco continentes, transformada numa festa ambulante ao estilo das fanfarras europeias. A 6 e 20 deste mês eles estarão nas FNAC’s de Cascais e Alfragide, respectivamente. Ainda em Abril, seguem-se os concertos no Montijo (dia 24), no Maxime, em Lisboa (dia 25) e na Semana Académica de Tomar (dia 30). Já em Maio, os Kumpania Algazarra vão estar no Festival Artis, em Seia (dia 10), Tavira (dia 17), Sesimbra (dia 21) e na Festa da Música e do Cinema, em Braço de Prata (dia 22).


"Malanka", Haydamaky (Ucrânia) - carpathian ska, ukranian dub machine, hutzul punk
Despedimo-nos com os ucranianos Haydamaky e “Malanka”, tema extraído do seu segundo disco “Kobzar”, lançado este ano, e onde a banda conta com as colaborações dos polacos Pidzama Porno e dos Zion Train, os reis do raggamuffin. Os Haydamaky levam-nos de novo pelos caminhos do ska das montanhas dos Cárpatos, do reggae, do punk hutzul e da dub machine, misturando-os com a folk ucraniana, o rap e o rock’n’roll. Após o colapso da União Soviética e a independência da Ucrânia, um grupo de estudantes criava a banda Aktus, que rapidamente conquistou um lugar de destaque no underground musical de Kiev. No início do novo século, em honra à rebelião histórica do século XVIII, eles decidiram mudar o nome para Haydamaky. Para além dos espectáculos que têm feito em toda a Europa de Leste, em 2004 apoiaram a revolução laranja que mobilizou o país, tendo um dos seus temas sido muito rodado nas estações de rádio alternativas. Música que assenta na combinação de raízes ucranianas com standards europeus, uma fórmula caracterizada pela energia turbulenta e por uma montanha russa de melodias.


Jorge Costa

terça-feira, 1 de abril de 2008

World Music Charts Europe - Abril 2008

Eis o TOP 20 relativo ao mês de Abril dos 186 discos nomeados para a tabela europeia de música do mundo (a lista pode ser consultada em http://www.wmce.de) pelos 49 membros do júri, representando um total de 24 países do velho continente. A assinalar, para além da permanência de Dulce Pontes, as novas sete entradas no topo do painel (seis em estreia absoluta no WMCE e uma a subir para os primeiros vinte lugares):

1º- 800, Mercan Dede (Turquia, Canadá) - Doublemoon
mês passado: 14ºlugar

2º- FRAGILE BEAUTY, Huong Thanh (Vietname, França) - ACT
mês passado: 2ºlugar
3º- THE MANDE VARIATIONS, Toumani Diabaté (Mali) - World Circuit
mês passado: 4ºlugar
4º- NEW DAWN - KU KHATA, Neco Novellas (Moçambique) - World Connection
mês passado: 13ºlugar
5º- WAMATO, Les Amazones de Guinee (Guiné) - Sterns
mês passado: 3ºlugar
6º- 1 REAL, DJ Dolores (Brasil) - Ziriguiboom
mês passado: 6ºlugar
7º- AKAPELLEANDO, Vocal Sampling (Cuba) - Skip Records
mês passado: 16ºlugar
8º- DIASPORA HI-FI, Watcha Clan (França) - Piranha
mês passado: 1ºlugar
9º- SOUNDS FROM A BYGONE AGE VOL. 5, Gabi Lunca (Roménia) - Asphalt Tango 
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10º- BALDAMORE, Hadouk Trio (França) - Naive
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11º- SOUL SCIENCE, Justin Adams & Juldeh Camara (Reino Unido, Gâmbia) - Wayward
mês passado: 12ºlugar
12º- BLACK STARS, vários (Gana) - Outhere
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13º- GRANDE FINALE, Magnifico (Eslovénia) - Arih
mês passado: 5ºlugar
14º- KOBZAR, Haydamaky (Ucrânia) - EastBlok
mês passado: 7ºlugar
15º- ZEGAR ZIVI, Zegar Zivi (Croácia) - Cloud Valley
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16º- EL CORAZÓN TIENE TRES PUERTAS, Dulce Pontes (Portugal) - Resistencia
mês passado: 18ºlugar

17º- TUDO AZUL, Velha Guarda da Portela (Brasil) - Red Circle
mês passado: 44ºlugar
18º- UMALALI: THE GARIFUNA WOMEN'S PROJECT, vários (Belize, Guatemala) - Cumbancha
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19º- DEVOTION, Cheb i Sabbah (EUA, Índia) - Six Degrees
mês passado: 17ºlugar
20º- AKWABA INISENE, Aly Keita (Costa do Marfim) - Contre-Jour
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