quinta-feira, 1 de março de 2007

Emissão #38 - 3 Março 2007

A 38ª emissão do MULTIPISTAS - MÚSICAS DO MUNDO, difundida no sábado, 3 de Março, entre as 17 e as 18 horas, na Rádio Urbana (Castelo Branco - 97.5 FM; Fundão, Covilhã e Guarda - 100.8 FM), vai de novo para o ar na quarta-feira, 7 de Março, entre as 21 e as 22 horas, sendo reposta três semanas depois (24 e 28 de Março) nos horários atrás indicados.

"Homecoming", Taraf de Haïdouks (Roménia) e Tunng (Reino Unido)
- gypsy music, folktronica
Os Taraf de Haïdouks com “Homecoming”, uma remistura dos Tunng extraída da colectânea “Electric Gypsyland 2”, editada em Novembro do ano passado. Uma série de reinterpretações e de reinvenções poéticas de músicos europeus, turcos e africanos, em que o ponto de partida é a música cigana. Os Taraf de Haïdouks ("banda de bandidos") são originários de Clejani, cidade localizada a sudoeste de Bucareste, na Roménia. Esta dezena de instrumentistas e cantores, em que convivem quatro gerações de lăutari (músicos), foi descoberta em 1990 por dois jovens músicos belgas que se apaixonaram pela sua sonoridade e decidiram dá-los a conhecer ao mundo. A música dos Taraf de Haïdouks, que varia entre as baladas e as danças, é uma mistura de estilos locais, representando na perfeição a riqueza da folk romena. O que chamou a atenção, entre outros, dos Tunng, banda inglesa que mistura a folk experimental com elementos da música electrónica, género habitualmente conhecido por folktronica ou electrofolk. Este duo de guitarras, formado por Sam Genders e Mike Lindsay, destaca-se quase sempre pelo uso de instrumentos pouco comuns, como por exemplo as conchas do mar. Os Tunng criam então uma atmosfera melódica e rural, a qual dá um
ar estranhamente britânico aos Taraf de Haïdouks.

"Gizonak Eztan Bear", Alboka
(Espanha) - basque folk
As músicas do mundo prosseguem com os Alboka, que nos trazem o tema “Gizonak Eztan Bear”, extraído
do álbum “Lau Anaiak” (Os Quatro Irmãos), lançado em 2004. Quarto trabalho do grupo que, para além das danças e melodias populares, retiradas dos cancioneiros bascos, integra temas instrumentais – então uma novidade na folk basca, mais habituada a trabalhos vocais – e novas canções, compostas por Allan Grifing e traduzidas para euskera pelo escritor basco Juan Garcia. O agora duo, formado pelo acordeonista Joxan Goikoetxea e pelo multi-instrumentista irlandês Alan Griffin (que há mais de vinte anos vive no País Basco), foi criado em 1994 juntamente com mais dois músicos daquela região autónoma espanhola: Txomin Artola e Josean Martín Zarko. Da sua história fazem também parte as vozes de Benito Lertxundi e Xabi San Sebastián, o violinista Juan Arriola e a cantora húngara Marta Sebestyén, que colaborou num dos álbuns do grupo. Um ensemble cujo objectivo é o de interpretar música tradicional exclusivamente de forma acústica, sua imagem de marca, e que foi buscar o nome à alboka, um aerofone pastoril basco, construído com dois chifres de vaca, e cuja sonoridade, parecida com a da gaita, se situa entre a sanfona e a bombarda francesa. Juntam-se-lhe o acordeão, o bouzuki, o bandolim, o ttun-ttun (tamboril basco, da família do saltério), a guitarra acústica, o violino, a harpa, a gaita, a flauta e as percussões. Uma ponte entre a música tradicional e a folk contemporânea, em que a energia basca se une à pureza irlandesa.

"Napoli", Kepa Junkera
(Espanha) - basque folk
Kepa Junkera de regresso ao programa com “Napoli”, tema retirado do seu último álbum “Hiri” (cidade), editado no ano passado. No seu disco mais intimista e elaborado, o músico leva-nos numa viagem por algumas das cidades e lugares de todo o mundo por onde passou. O exímio executante da trikitixa (fole do inferno), acordeão diatónico basco que em Portugal é conhecido por concertina, dá então destaque à txalaparta (instrumento de percussão, tocado com peças de madeira), à alboka (aerofone tradicional basco, constituído por dois chifres de vaca) e à sanfona. Kepa Junkera tornou-se o mais internacional dos músicos bascos ao fundir a folk da sua terra e a música triki com os ritmos do mundo. Uma palete sonora que começou com uma abertura ao jazz, à música clássica e à folk-rock, e que mais tarde anexou os ritmos do Quebeque, do Mediterrâneo, das Canárias, da Europa Central, de África e da Irlanda. Em “Hiri”, o músico de Bilbao conta com a participação de músicos como o albokari Ibon Koteron, Patrick Vaillant, Glen Velez, Marcus Suzano, Alain Bonnin, os Etxak, o Alos Quartet, Gilles Chabenat, Jean Wellers, Carlos Malta, Lori Cotler, Andy Narell, os catalães Tactequete, Xosé Manuel Budiño, os italianos Enzo Avitabile & I Bottari Di Pórtico e as vozes das Bulgarka, da cantora azeri Aygun, de José António Ramos, Benito Cabrera, Mercedes Peón e Eliseo Parra. Mas se tivermos em conta toda a discografia de Kepa Junkera, há que acrescentar ainda as colaborações de nomes como os Oskorri, o duo de txalapartaris Oreka TX, John Krikpatrick, Riccardo Tessi, Maria del Mar Bonet, Justin Vali, Hedningarna, La Bottine Souriante, Phil Cunningham, Liam O’Flynn, Béla Fleck, Andreas Wollenwaider, Pat Metheny e Caetano Veloso, bem como os portugueses Júlio Pereira e Dulce Pontes.

"Dirt And Blood", Antibalas Afrobeat Orchestra (EUA) - afrobeat
Seguem-se os Antibalas Afrobeat Orchestra com “Dirt And Blood”, tema extraído do seu trabalho de estreia “Liberation Afrobeat Volume I”, lançado em 2001. Este colectivo multiracial (eles são latinos, afro-americanos, africanos e americanos asiáticos que vivem em Nova Iorque nos bairros de Brooklyn, Manhattan e Bronx, e em Bayonne, na Nova Jérsia), formado em 1998 pelo saxofonista Martin Perna, inspirou-se no saxofonista e activista nigeriano Fela Anikulapo Kuti, fazendo renascer a herança musical do fundador da afrobeat. Um género em que os Antibalas Afrobeat Orchestra puderam enquadrar os diferentes interesses musicais e preocupações políticas de cada um dos seus membros. O som desta banda nova-iorquina, cuja formação varia entre os 14 e os 20 elementos, combina highlife, jazz, soul, funk, dub, ritmos e percussões africanas e cubanas. Eles têm tocado não só com outros criadores do legado da afrobeat, entre eles o percussionista Tony Allen ou o trompetista Babatunde Williams, mas também aberto as fronteiras a James Brown, No Doubt, Wyclef Jean ou Trey Anastasio. O cariz político das letras e as posições provocadoras dos Antibalas são outro dos aspectos da herança de Kuti. Estas incitam à insurreição e à “desfranchização” do mundo, atacando o sistema capitalista em inglês, castelhano e yoruba. Consciência social e mensagens políticas à mistura com muito ritmo e percussão...

"Marena-Wotetea", Gigi (Etiópia) - world fusion, afrofunk
Avançamos agora até à Etiópia com o tema “Marena-Wotetea”, extraído do álbum “Gold and Wax”, editado em 2006. Conhecida como Gigi, Ejigayehu Shibawba é uma das mais célebres cantoras etíopes, apresentando-se quer a solo, quer com as formações Tabla Beat Science e Abyssinia Infinite. Acompanhada por instrumentos acústicos como a harpa kirar ou a flauta washint, ela combina melodias tradicionais do seu país com uma grande variedade de estilos como o jazz, a soul, a dub e o afrofunk. A viver actualmente nos Estados Unidos da América, Gigi é casada com o baixista e produtor Bill Laswell, que há seis anos produziu o seu álbum de estreia, disco em que foram introduzidos instrumentos electrónicos e que entre os convidados incluía o célebre David Gilmore. Neste seu último trabalho, Gigi cruza harmonias africanas com elementos jamaicanos e indianos e batidas do Ocidente. Um arranjo complexo e moderno de canções de dança e melodias, com muito ritmo e percussão à mistura. São sons menos tradicionais que seguem o caminho de outros fusionistas etíopes. Um álbum que contou com a participação de músicos como o virtuoso do sarangi Ustad Sultan Khan, o mestre da tabla Karsh Kale, o teclista Bernie Worrell, Nils Petter Molvaer, ou dos músicos africanos Abesgasu Shiota, Hoges Habte Aiyb Dieng e Assaye Zegeye.

"Tauti", Värttinä (Finlândia) - traditional finnish folk/suomirock
Para já, a mais conhecida banda da folk contemporânea finlandesa traz-nos o tema “Tauti” (Doença), uma apelativa mistura de pop e rock ocidental com folk europeia e nórdica, extraída do álbum “Iki” (termo que a banda define como sendo “o sopro principal e eterno”). Trabalho editado no vigésimo aniversário do grupo, em 2003, e que marcou o seu regresso às grandes melodias. As Värttinä são conhecidas por terem inventado uma visão contemporânea da tradição vocal feminina e da poesia popular da Carélia – uma região isolada na fronteira entre a Finlândia e a Rússia – reforçando as letras emocionais com ritmos em fino-úgrico, idioma antecessor do finlandês. O grupo nasceu em Raakkylaa, uma pequena cidade na Carélia filandesa. Entusiasmados pelas mães, alguns miúdos juntaram-se para cantar músicas folk e tocar kantele (uma versão filandesa do zither, instrumento da família da cítara). À medida que foram crescendo, muitos deixaram o grupo, mas quatro raparigas criaram uma nova formação, que continuou a fazer arranjos tradicionais mas passou também a compor temas próprios. Actualmente fazem parte das Värttinä Mari Kaasine, Johanna Virtanen e Susan Aho, vozes enérgicas e harmónicas que são suportadas por seis músicos acústicos que aliam a instrumentação tradicional e contemporânea (feita à base da guitarra, violino, acordeão, baixo e percussões) aos ritmos complexos e arranjos modernos. Uma base rítmica sólida em que se mantém o vigor e o calor vocal de sempre.

"Pjesna Ljesorubov", Mari Boine (Noruega), Inna Zhelannaya e Sergey Starostin
(Rússia) - progressive folk music
A tripla Mari Boine, Inna Zhelannaya e Sergey Starostin traz-nos “Pjena Ljesorubov” (Canção do Lenhador), tema extraído do álbum “Winter In Moscow”, lançado em 2001. No início dos anos 90, uma jornalista norueguesa apresentou a conterrânea Mari Boine àqueles dois elementos dos Farlanders, formação moscovita que misturava a folk russa com o jazz e o rock. No Inverno de 1992 todos eles juntaram-se primeira vez em estúdio em Moscovo com outros músicos noruegueses e russos para gravar este disco, trabalho onde exploram a música ocidental sem no entanto esquecerem as suas tradições. Dotada de uma voz mística, a embaixadora dos sami tem vindo a lutar pela preservação das tradições e pelo reconhecimento dos direitos do povo da Lapónia, no norte da Escandinávia. Mari Boine, que canta também em inglês, mistura o joik com os blues, o jazz, o rock e a música electrónica. Já o interesse do vocalista russo Sergey Starostin pela etnomusicologia do seu país levou-o a viajar pela então União Soviética, acabando por reunir histórias, músicas e instrumentos tradicionais. Um trabalho que deu os seus primeiros frutos no Moscow Art Trio, grupo com que combinaria elementos da folk, do jazz e da música clássica. Finalmente, a cantautora Inna Zhelannaya, que começou a sua carreira na banda Allians, destaca-se pela mistura de folclore russo e bielorusso com o rock, a música do mundo e os sons electrónicos.

"La Procesión", Kevin Johansen (Argentina) - rumba, cumbia, world fusion
A fechar o programa, despedimo-nos c
om Kevin Johansen e o tema “La Procesión”, retirado do seu segundo disco a solo “Sur o no Sur”, editado em 2002. Álbum onde o músico argentino, nascido no Alaska, envereda por canções que predominam sobre géneros tipicamente americanos mas, como ele próprio diz, “desclassificados”: o tango, o bolero, a ranchera mexicana, a rumba catalã, o samba celta, a bossanova, a cumbia flamenca, o tex-mex, o zydeco ou a milonga, habilmente cruzados com a pop, o hip-hop ou o funk. Kevin Johansen passou a sua adolescência em Buenos Aires, mas desde muito cedo que começou a percorrer o mundo de guitarra debaixo do braço. Depois de ter vivido alguns anos em São Francisco, Manhattan e Nova Iorque, no final dos anos 90 o compositor decidiu então regressar à Argentina e explorar as suas referências folclóricas, deixando para trás uma breve experiência pop-rock no grupo Instrucción Cívica. Hoje, juntamente com a sua banda The Nada, Kevin Johansen interpreta temas em castelhano, inglês ou mesmo “espanglês”, mistura de estilos e linguagens onde o humor, o sarcasmo e a ironia estão sempre presentes. Um desenraizamento sonoro, imagem de marca da Argentina actual, onde se prova que o futuro da música passa mesmo pela mistura.

Jorge Costa

Sem comentários: