A sonora algazarra de Sintra vagueia pelas músicas dos cinco continentes, transformando os sons em que toca numa festa ambulante, ao estilo das fanfarras europeias. O seu primeiro álbum, agora lançado, sintetiza as andanças pelo país e pela Europa, viagens em que a banda contaminou e se deixou contaminar por outros garimpeiros.
Fundir géneros e animação é a fórmula seguida pelo grupo
(foto: Kumpania Algazarra)
Eles surgiram em Sintra em 2004, e desde então que os Kumpania Algazarra apostam numa música enérgica, feita para ser interpretada e dançada na rua. Servindo-se da habitual linha de instrumentos de sopro (clarinete, saxofone, trompete e trombone), a que se juntam o acordeão, a guitarra, o contrabaixo ou as ribombantes percussões, os oito jovens elementos do grupo (acresce outro, convidado no álbum de estreia da banda) tocam e cantam em várias línguas, entre elas o português. Uma sonora algazarra que deambula pelas músicas do mundo, transformando os sons em que toca numa festa ambulante, bem ao estilo das fanfarras europeias.
“O primeiro propósito foi sem dúvida a música. Depois, quase ao mesmo tempo, pensámos: já que tocamos instrumentos portáteis que não necessitam de electricidade, porque não irmos para a rua e tentarmos fazer disto uma festa, numa partilha com as pessoas que sempre acorrem às ruas de Sintra?”, conta ao MULTIPISTAS - MÚSICAS DO MUNDO Luís Bastos, clarinetista e saxofonista dos Kumpania Algazarra. “Poderiam haver muitos adjectivos a usar quando nos referimos a esta banda. Muita da imagem que passa para fora é uma imagem real. Poucas coisas ali são fictícias ou arranjadas para dar um certo ar. A banda é muito assim, é genuína”.
Uma genuína mistura de sentidos e sonoridades, que é também uma provocação à música cada vez mais homogénea. Referências que os Kumpania Algazarra foram buscar aos cinco continentes e a nomes como Emir Kusturica, Fanfare Ciocărlia, Gogol Bordello, Rachid Taha, Fela Kuti, Buena Vista Social Club, Manu Chao ou Bob Marley. Os ritmos ciganos balcânicos, árabes e latinos aliam-se então a estilos como a afrobeat, a folk, o reggae, o funk, o ska, o son, o swing, o klezmer, o gnawa ou o rock. Um ambiente multicultural onde a banda abre espaço a temas caros a toda a sociedade como a guerra, a pobreza ou a imigração.
“As causas sociais e a festa podem não andar de mãos afastadas, podem coexistir. Para nós, faz todo o sentido de aproveitarmos da melhor maneira tudo aquilo que sabemos fazer, e tentarmos com isso pôr alguma igualdade neste mundo em que vivemos”, justifica o músico. “As diferentes proveniências de estilos musicais advêm também do grande número de elementos que compõem a banda. Cada um tem as suas influências e cada um as traz depois para a sala de ensaio. Aí, muitas dessas ideias são escutadas e discutidas, e depois nós chegamos a um resultado. E esse resultado reflecte paisagens sonoras às quais nós não estamos habituados em Portugal”.
Paisagens coloridas, cada vez mais habituais no universo da música do mundo. Com o nomadismo nos genes, a caravana começou a cruzar a Europa. Depois de uma passagem pelo Festival Andanças e de terem realizado vários espectáculos na Galiza e no País Basco, eles partiram numa digressão à descoberta da Eslovénia. Segue-se a Itália, onde os Kumpania Algazarra irão estar entre 29 de Maio e 1 de Junho. Percursos onde contaminam e se deixam contaminar por outros garimpeiros de sons, entre eles os Blasted Mechanism, os Terrakota e as Tucanas.
“O contágio faz-se para além da música porque existem relações humanas muito fortes com cada uma dessas bandas. Ainda antes de tocar nos Algazarra, nos primeiros álbuns de Blasted Mechanism era eu que tocava os sopros. Os Terrakota fazem também parte da grande família da Algazarra, tal como as Tucanas, que nos convidaram para participar no álbum delas. Claro que nós dissemos que sim, porque gostamos destas contaminações musicais que existem de banda para banda”, refere Luís Bastos. “Neste mundo globalizado, cada vez é mais fácil o acesso a diferentes fontes musicais. Temos sempre a tendência de olhar para elas com algum espanto, daí que é grande a tentação de mexer com elas. Há uma variedade quase interminável de possibilidades, o que sem dúvida atrai muito os músicos e compositores”.
Em Fevereiro, os Kumpania Algazarra lançaram o seu primeiro disco, baptizado com o nome do grupo. Uma edição própria que inclui doze temas originais, inspirados em diversas latitudes sonoras. Parte do caminho trilhado até agora, sem pressas, pela banda, que em mãos tem já material para um segundo trabalho.
“Quatro anos volvidos, e depois de muita estrada e rua, apareceu o primeiro álbum que é o reunir dos temas que até então temos vindo a tocar. Como é o primeiro, nós pensámos que tinha de ser bem feito, com o nosso tempo e à nossa maneira, sem a pressão de uma editora”, acrescenta o clarinetista e saxofonista. “Poderemos esperar o reforço de características da banda, mas as influências são tantas que é provável que também nos deixemos contaminar por novidades musicais”.
A algazarra de experimentações prossegue, tendo como pano de fundo uma panóplia global de influências. Mundo sonoro em permanente ebulição, todo ele entregue à imaginação fértil desta fanfarra portuguesa.
Jorge Costa
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